Bastava uma leitura atenta ao recente teste do Latin NCAP com o Chevrolet Onix para perceber que havia algo estranho. Aliás, mais de uma coisa. Se os testes são feitos na Alemanha, com veículos comprados em concessionárias, como um carro que passou a receber melhorias em 15 de janeiro foi testado e teve seus resultados apresentados em 23 de janeiro? Tudo em apenas 8 dias? Como se poderia dizer que o Prisma também recebeu as melhorias se apenas o Onix foi testado? Questionamos o Latin NCAP sobre essas questões e conseguimos esclarecimentos relevantes sobre elas.
Segundo Alejandro Furas, secretário-geral da entidade, o Onix levado para testes foi retirado da linha de montagem em novembro do ano passado. "Em uma fábrica, normalmente as mudanças de produção não são feitas da noite para o dia. Elas ocorrem gradualmente ao longo de semanas ou até meses. Antes dessa data (15 de janeiro), já havia em produção alternadamente algumas unidades de Onix e Prisma com as melhorias. E elas já foram para o mercado mesmo antes do final de 2017. Desde o dia 15 de janeiro, todas a unidades de Prisma e Onix, 100%, têm as mudanças, e não são produzidos mais carros sem elas." As unidades selecionadas já traziam as melhorias que seriam adotadas para todos os veículos a partir de 15 de janeiro. "Muitas vezes é necessário pegar carros da linha de produção se desejarmos mostrar um resultado junto ou perto do lançamento do automóvel. Dessa forma, otimiza-se o processo e se informa o consumidor a tempo de ele decidir a compra", diz Furas.
Pegar os Onix (e os VW Polo e Virtus) na linha de montagem era preciso. Afinal, o ciclo de testes leva, no mínimo, um mês. "Da seleção de unidades até o início do transporte, são pelo menos duas semanas. Aí temos também os tempos de alfândega e de transporte internacional. Se o transporte for aéreo, isso demora no máximo uma semana. Se for marítimo, pode demorar três ou quatro semanas, somadas às semanas inicias. Por fim, os carros às vezes ficam parados aguardando a data do teste", explica o secretário-geral.
Mas, afinal de contas, por que o Prisma também recebeu as 3 estrelas se só unidades do Onix foram avaliadas? "O Onix e o Prisma são da mesma linha de produção, com os mesmos processos e peças na estrutura. Além disso, a diferença de peso entre Prisma e Onix é menor do que 150 kg e a distância entre-eixos é a mesma. No momento da seleção, apenas o Onix trazia as melhoras", diz Furas.
Para quem acha que o processo de testes termina por aí, vem algo fundamental para a boa reputação da avaliação: uma auditoria posterior. "Um tempo depois da divulgação dos resultados, compramos carros nas concessionárias. Estes carros, então, são transportados para o laboratório e fazemos outro crash-test. Convidamos a montadora a presenciar o teste. No caso do Onix, teremos de confirmar que são unidades produzidas depois de 15 de janeiro. Nada impede que façamos a auditoria com o Prisma. Isso pode acontecer. Na auditoria, o Latin NCAP geralmente pega o carro com outra carroceria se isso for possível e se ele existir. Lembre que o crash-test frontal do Ka foi com o sedã e o lateral com o hatch, por exemplo. Mesma coisa com o HB20 hatch e o sedã".
Para a turma do "se pagou, passou", acusação feita recorrentemente ao Latin NCAP, Furas tem a seguinte resposta: "Lembre-se, por exemplo, do Nissan Murano avaliado em 2016. O teste foi patrocinado e o carro obteve 2 estrelas para ocupante adulto, entre outros exemplos. O Latin NCAP solicita o pagamento após o resultado ser publicado. Houve vezes em que as montadoras do Brasil demoraram quase 2 anos em fazer o pagamento. Nós gostaríamos de avaliar todos os carros do mercado, mas isso não é possível porque o Latin NCAP é uma ONG com orçamento muito limitado. Para não limitar os modelos testados, o Latin NCAP tem o mecanismo de patrocínio, que pode vir de um governo, de uma organização ou mesmo de uma montadora. Até agora, somente as fabricantes patrocinaram testes. O processo do Latin NCAP é aberto e transparente e sempre temos o teste de auditoria para verificar a qualidade da segurança oferecida pelo carro. O que quase sempre acontece é que as montadoras só fazem o patrocínio de carros com bom nível de segurança. Isto acontece porque os testes do Latin NCAP não são obrigatórios. Nem todos os carros são avaliados. No dia em que isso acontecer, achamos que os questionamentos serão encerrados".