A Lifan lançou nesta semana o X80, primeiro veículo tratado como "premium" pela marca e que, de quebra, registra um marco para os carros chineses no Brasil: o SUV é o modelo mais caro importado daquele país à venda por aqui. Com preço sugerido de R$ 129.777, o X80 aposta em seu porte de Toyota SW4 e na capacidade para levar até 7 pessoas para perseguir seu lugar ao sol em um segmento muito disputado no mercado. E com grau de exigência maior do que a Lifan está acostumada a lidar, considerando que seu produto mais bem sucedido é o X60, um dos SUVs mais baratos do Brasil. A novidade já está disponível nas concessionárias da marca.
INTRODUÇÃO
Para aqueles que têm boa memória, o X80 não é um nome totalmente desconhecido. A Lifan trouxe o conceito do modelo para o último Salão do Automóvel em São Paulo, em 2016, numa versão praticamente de produção do utilitário. Tanto que, de lá para cá, pouco mudou o carro, que fez sua estreia na China no final do ano passado. O carro mede 4,82 m de comprimento, 1,93 m de largura, 1,76 m de altura e ótimos 2,79 m de distância entre-eixos. E é justamente esta última medida que justifica o apelo de "SUV 7 Estrelas" que a Lifan usará para comercializar o X80. Ela faz alusão aos 7 lugares da cabine (seu principal diferencial) e à lista extensa de equipamentos e acabamento mais caprichado e "luxuoso", segundo a fabricante.
De fato, o espaço é disparado o melhor atributo do X80. A cabine não desaponta em oferecer um aproveitamento capaz de transportar cinco pessoas com elevada dose de conforto. Os bancos de material sintético que imita couro abrigam muito bem os ocupantes e a segunda fileira se aproveita de um assoalho plano. Sobra área para pernas e ombros e há uma saída dedicada de ar-condicionado, com comandos de velocidade do ventilador e de temperatura. A terceira fileira merece ressalvas. É verdade que o espaço ali comporta dois adultos, conforme defende a Lifan. Porém, nem de longe a acomodação permite o mesmo nível de conforto de quem viaja na frente. Para um adulto de estatura média curtir o trajeto sem maiores problemas, é preciso pedir para que os passageiros da frente sacrifiquem parte considerável de seu espaço por meio do ajuste de distância dos assentos, liberando mais área para as pernas de quem se senta no fundo. Se não for problema ajustar a inclinação do encosto da fila do meio também, aí sim dois adultos podem viajar ali. Caso contrário, é melhor reservar o lugar para crianças e adolescentes.
Ainda assim, sente-se falta de opções de comodidade para quem vai na terceira fileira. Por exemplo, não há tomadas ou entradas USB para facilitar a utilização de smartphones e outros eletrônicos, tampouco há janelas ali, o que pode causar certa sensação de claustrofobia para os menos simpáticos a lugares fechados. Com os últimos dois assentos erguidos, o espaço do bagageiro do X80 fica, naturalmente, mais limitado, com capacidade para 200 litros. Com a terceira fileira rebatida, o volume do porta-malas sobe para 900 litros. Porém, esta medida considera o preenchimento até o teto, conforme os chineses medem no país de origem do modelo. No Brasil, a informação correta seria até o limite do encosto dos bancos assento. É possível rebaixar a segunda fileira também e aí há área para mais de dois mil litros.
Se a cabine do X80 se destaca pelo espaço, falta originalidade. A impressão ao entrar no carro é que você já esteve ali antes. Isso porque há muitos elementos idênticos ou muito similares a outros modelos do mercado. Das hastes atrás do volante aos comandos do console central, tudo parece ter sido reaproveitado de outros carros, o que não significa que as peças sejam necessariamente ruins, mas faz o SUV perder autenticidade. Por exemplo, por quase R$ 130 mil é difícil ignorar o visual ultrapassado dos comandos da central multimídia e do ar-condicionado, todos botões físicos com aparência de Hyundai HB20 de entrada. A manopla do câmbio automático é uma viagem aos anos 1990 pelo seu formato redondo e de tamanho avantajado.
Por conta destes detalhes, tentativas como a das peças de plástico imitando madeira, que poderiam criar um ambiente mais refinado ao habitáculo, acabam sendo anuladas pelo design conservador demais da cabine. Ao menos não há qualquer rebarba aparente e as peças são muito bem encaixadas, com direito a material emborrachado no painel e couro onde mais se encosta (nas laterais das portas e revestindo o baú central). Nem mesmo o painel digital, com três opções de layout diferentes e a tela de 8 polegadas do sistema multimídia conseguem transmitir um apelo tecnológico ao X80. Todavia, a central é touchscreen (com a ressalva de ficar um tanto distante para utilização do motorista) e conta com Apple CarPlay e Mirror Link para espelhamento de smartphones Android.
Esta sensação de já ter visto o X80 em algum lugar também ocorre ao observá-lo de fora, embora em menor grau. O design do SUV segue linhas tradicionais de SUV, com traços mais retilíneos e linha de cintura alta, mas é possível notar algum nível de inspiração na fonte sulcoreana de design, sobretudo por conta da grade cromada avantajada na frente e pelo formato das lanternas. As rodas de aro 19 diamantadas são destaques do visual externo, pois casam bem com o porte do veículo.
AO VOLANTE
Ao ler a ficha técnica do X80, a configuração do SUV chega a impressionar. Ele é equipado com motor 2.0 turbo, com duplo comando de válvulas e injeção direta de combustível, capaz de gerar 184 cv a 5.000 rpm e 28,6 kgfm de torque entre 1.600 e 3.600 rpm. Porém, na prática, seu peso de 1.885 kg e o casamento entre o câmbio automático de seis marchas e o motor não produzem um desempenho animador ao X80. Há evidente dificuldade do conjunto em embalar o SUV ao recorrer ao kickdown e, mesmo no modo Sport, o vigor do torque é sentido apenas nos primeiros segundos de aceleração (e nas rotações iniciais). Conforme a velocidade progride e o motor gira mais alto, é nítida a falta de fôlego do carro. Como rodamos majoritamente em estradas, pudemos perceber que é melhor calcular bem qualquer ultrapassagem que você tenha que fazer a bordo do X80. E fazê-las apenas com uma boa margem de segurança, pois a resposta do utilitário é fraca.
Este comportamento comedido acaba influenciando o consumo. Oficialmente, segundo a fabricante, o X80 é capaz de rodar 8,4 km/l na cidade e até 12,2 km/l em rodovia, somente a gasolina. Porém, o motorista se vê obrigado a abusar do pedal direito para atingir um nível de desempenho agradável para um carro desta estirpe, fazendo a eficiência despencar para níveis urbanos em nosso teste por estradas (anotamos 8,5 km/l no computador de bordo do SUV em circuito rodoviário).
Uma vez que o SUV embale, já em velocidades mais altas, aí ele dá mais conta do recado e consegue entregar uma rodagem bastante linear e confortável. O que pode prejudicar levemente o conforto são os leves solavancos que o câmbio dá quando o motorista tira o pé do acelerador após uma acelerada. A caixa também produz um leve ruído ao ser exigida com mais afinco. Pelo menos a rolagem da carroceria do SUV é surpreendentemente controlada. No trecho mais sinuoso do trajeto rodoviário, o X80 se saiu muito bem, sem transferir peso lateral de maneira incômoda. A suspensão independente atrás é uma das armas do modelo para se segurar bem em curvas.
Outros dois quesitos que ainda merecem mais atenção dos chineses são a precisão da direção e a resposta dos freios. O SUV leva certo tempo para apontar nas curvas após o comando no volante, o que mostra folga acentuada no centro de esterçamento. E o pedal do freio é um tanto "borrachudo", obrigando o uso de 50% ou mais de seu curso para que o X80 pare com mais "vontade".
CONCLUSÃO
Além da oferta generosíssima de espaço, outra carta na manga da Lifan foi rechear o X80 com equipamentos. Nós já citamos o ar-condicionado de três zonas, o painel digital e a central multimídia de 8 polegadas, mas ainda faltou falar dos 6 airbags, controles de estabilidade e de tração, assistente de partida em rampa, controle de velocidade em descida, controlador de velocidade, sensores de estacionamento dianteiros e traseiros, câmera de ré, sensor crepuscular, sensor de chuva, DRL de LED, faróis de neblina, teto solar, ajustes elétricos dos bancos dianteiros, partida por botão, freio de estacionamento eletrônico, retrovisores externos com aquecimento e outros mimos. É uma lista extensa que deixa concorrentes da sua faixa de preço (e mais caros) com um pingo de inveja.
Como comentamos logo no início, o segmento de SUVs médios é bastante disputado. O Lifan se enquadra nele apenas por preço, mas traz tamanho e equipamentos de níveis superiores. Mesmo assim, o conjunto da obra do X80 ainda deixa a desejar frente ao Jeep Compass, Chevrolet Equinox, novo Volkswagen Tiguan e Peugeot 3008, para citar os principais. O modelo chinês fica atrás destes rivais em desempenho, estilo, acabamento e qualidade de materiais. A Lifan também sofre com uma rede de concessionárias limitada (são 46 lojas pelo Brasil), algo que, segundo a companhia, será expandido após a chegada do X80, cuja meta de vendas é de 120 unidades por mês (expectativa conservadora, mas condizente com a condição da marca no país).